Por Fábio Pessôa*
Muito interessante a reportagem publicada na revista Carta Capital (edição de 04/08/2010, nº607) sobre a utilização, por parte da direita política brasileira, do discurso de demonização das FARC ao relacioná-la ao PT e a Lula. Como já é sabido, o candidato José Serra (PSDB) acusou o PT de apoio ao terrorismo e à violência política como meio de chegada ao poder. O resultado prático é que tal discurso só animou as viúvas da guerra fria, uma vez que não houve alteração alguma no cenário eleitoral. Além disso, a justiça deu ganho de causa ao pedido de direito de resposta impetrado pelo PT.
Na reportagem de Carta Capital ficou evidente a relação entre a violência endêmica existente na Colômbia com a formação das FARC. Criada em 1964, as FARC são o resultado da radicalização política na Colômbia, com massacres de camponeses e assassinatos de sindicalistas e líderes políticos, como Eliécer Gaitán, da União Nacional da Esquerda Revolucionária. Gaitán foi vítima de uma emboscada, tudo indicando se tratar de uma operação da CIA. Tal violência permanece até hoje. Em 2008, por exemplo, 37 lideranças sindicais foram mortas na Colômbia.
Ainda assim, as FARC são simplesmente associadas ao narcotráfico, sobrando quase nada de conteúdo ideológico de sua luta. Quando Álvaro Uribe se elegeu em 2002 assumiu com muito entusiasmo o Plano Colômbia, permitindo a instalação e ampliação de bases militares estadunidenses em território colombiano. Supostamente, o Plano serviria para combate ao narcotráfico. Supostamente, porque os resultados da ação sugerem que houve uma diminuição pela metade dos combatentes das FARC (20 mil para 10 mil) e, contraditoriamente, um grande volume de produção de cocaína continua sendo feito na Colômbia e países vizinhos, notadamente o Peru.
Evidentemente, há uma assumida ligação das FARC com a produção de coca colombiana, através das chamadas “taxas revolucionárias” pagas por produtores em áreas controladas pela guerrilha. Mas, e aí vale a força da reportagem, do lodo oposto do espectro político há uma relação com o tráfico ainda maior. Primeiro, com o poderoso grupo paramilitar Autodefesas Unidas de Colombia (AUC), financiado pelo narcotráfico para combater as FARC. Uma espécie de milícia privada a serviço dos grandes cartéis colombianos. Segundo, o próprio Uribe foi financiado pelo dinheiro do tráfico quando era deputado. Sua família foi historicamente ligada ao cartel de Medelim.
Ignorar esses fatos e transportar mecanicamente a tragédia colombiana para a conjuntura política brasileira é uma afronta à história. É não dizer que esse discurso radicalizou o massacre de camponeses colombianos, através das execuções sumárias nos chamados “falsos positivos”.
Enquanto os tucanos se desesperam e vão atrás de recursos próprios ao terrorismo psicológico, o PT e demais partidos de esquerda do Brasil e América Latina se encontrarão, entre os dias 17 e 20 de agosto, em Buenos Aires, na XVI edição do Foro de São Paulo. Criado há 20 anos, o Foro vem discutindo saídas para os problemas políticos, sociais e econômicos dos latino americanos, contra o imperialismo e na defesa da soberania, democracia e cooperação continental. Enquanto Serra e o PSDB se assombram com os fantasmas da guerra fria, nós, os loucos de cara, nos presentamos com o futuro.
*Professor, membro da direção estadual do PT no Pará.
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