Movimento Estudantil nos anos 60 e a Resistência ao Golpe Militar no Pará
Há tentativas de resistência ao golpe das forças armadas em 1964 em Belém. A União Acadêmica Paraense publica nota oficial no jornal “Folha Vespertina” em 1º de abril, em que admite haver um processo de golpe contra o mandato do presidente; resolve decretar greve geral dos estudantes universitários paraenses e conclama a unidade política com outros segmentos da sociedade, notadamente soldados das forças armadas, os camponeses e os trabalhadores em geral. A nota expressa o arco de alianças passadas no campo das esquerdas no Brasil como capaz de defender a legalidade e as reformas de base. A análise da nota permite afirmar que os estudantes estavam interessados em mudar o mundo, mas não somente isto os animava, o desejo de ver implementado no Brasil uma sociedade solidária, menos competitiva e acima de tudo nacionalista e voltada para o bem-estar da população mais pobre. A nota expressa também a noção de que os dirigentes da UAP viam-se na vanguarda da resistência ao golpe, colocando os estudantes como parte fundamental da aliança de forças capazes de dirigir o Brasil.
O “Jornal do Dia” veicula como o Governo Estadual, trabalhadores e estudantes esperavam o golpe, em matéria do dia 1˚ de abril de 1964 as primeiras figuras do governo faziam vigília quando começaram a circular em Belém as primeiras notícias de que a crise nacional se agravara. No gabinete do governador, encontravam-se vários secretários do governo, além do prefeito de Belém Isaac Soares. Newton Miranda, governador do Estado, acompanhou tudo pelo rádio e esteve o tempo todo com as forças armadas do Estado pensando em como manter a ordem e a segurança. Não houve questionamentos à quebra da normalidade democrática por parte das autoridades constituídas no Estado. Quem sai na defesa da democracia e da ordem são os estudantes, os trabalhadores vinculados a alguns sindicatos e lideranças estudantis, sindicais e partidárias. A Universidade silencia e verá vários de seus discentes e docentes serem presos, torturados, constrangidos e submetidos a comissões de inquéritos.
O clima transcrito nos jornais era de tranqüilidade e calma e o posicionamento do governo estadual era apenas de expectativa com relação a revolução. As lideranças sindicais no mesmo dia acataram a decisão da CGT de entrar em greve, tendo em vista a possibilidade de fechamento dos sindicatos, também fizeram a indicação de um representante para ir ao Rio de Janeiro saber das decisões tomadas mediante a situação que era de alerta aos trabalhadores. As lideranças estudantis de imediato convocaram uma greve, aceitando o decreto nacional lançado pela UNE em defesa das liberdades individuais.
A UAP se declara em vigília cívica, servindo de sede de informação para estudantes e populares. Por meio de um alto-falante que retransmitia a programação da “rede da legalidade” liderada por uma rádio do Rio Grande do Sul, o governador Brizola falava em defesa da legalidade, em defesa do mandato do presidente João Goulart. O universitário José Seráfico redige um manifesto denunciando o golpe. A convocação da greve geral só teve cumprimento em poucos estados. A inação era generalizada.
Os estudantes eram as vozes mais barulhentas na denúncia do golpe militar, daí porque a invasão deveria funcionar como um cala-boca corretivo.
Naquele momento, a UAP estava cheia. Todos evidentemente sabiam das movimentações. No dia 1º de abril, por volta das 19 horas a UAP foi invadida por tropas do exército e tudo foi quebrado. Havia um teatro de arte popular, que foi destruído, o famoso TAP, uma versão Parauapa do CPC da UNE . Foram presos dois militantes do PCB, vestidos de cuecas e sapatos, Humberto Lopes e Jocelyn Brasil, seqüestrados de suas casas. Na parte da UAP, as metralhadoras foram apontadas para a sede, com soldados deitados nas calçadas. Os estudantes fugiam pelos quintais enquanto a sede da UAP era destruída pelos soldados.
Pedro Galvão, presidente da UAP, passou mais de 50 dias preso, indiciado em Inquérito Policial Militar. Os estudantes presos em 1964, quando falam de suas experiências, expressam o medo que vários setores da sociedade tinham do comunismo. Hoje a historiografia indica que o golpe de 64 foi um golpe preventivo, contra as reformas de base. Logo após o golpe, o reitor Silveira Neto pede a renúncia da diretoria do DA de Filosofia, Ciências e Letras: Era diretor da Faculdade o Cônego Ápio Campos, que levou a proposta para as lideranças universitária, que seriam transferidas para outros Estados caso aceitassem a renúncia. Sem a renúncia haveria a expulsão dos estudantes Roberto Cortez, Walter Pinheiro, Mariano Klautau, José Maria Platilha e Isidoro Alves. Apesar do pedido do reitor não houve a renúncia do DA de Filosofia, Ciências e Letras a não ser a do presidente. No mesmo momento, foi proposto pelo Coronel Alacid Nunes que houvesse eleições indiretas para os DAs, com triagem de nomes. O Dr. Silveira Neto foi informado por meio de um amigo do coronel Jarbas Passarinho que não era para expulsar estudantes e assim os militantes terminaram seus cursos.
Na engenharia, os soldados do exército fecharam o Diretório Acadêmico. Houve prisões na Filosofia, Ciências e Letras, que havia entrado em greve em 64, antes do golpe, conseguindo que os cursos da Faculdade voltassem a ter o bacharelado com as disciplinas antigas, direito adquirido para os ingressantes antes de 1962, sistema 3+1, bacharelado e licenciatura. No mesmo ano, após o golpe, há o fechamento do Diretório Acadêmico de Filosofia. Fica sob a responsabilidade do Major Alacid Nunes a presidência do IPM, que deveria apurar a existência de subversão entre os universitários. O estudante de direito Ronaldo Barata teve nota zero nas provas da Faculdade de Direito. Ao recorrer à congregação da Faculdade pedindo a oportunidade de fazê-las por ter sido impedido por ato contra sua vontade, pois estava preso sem culpa formada e crime definido, teve consentimento dado pela congregação.
Flávio Suplicy de Lacerda, Ministro de Educação e Cultura, em abril de 1964, institui as Comissões Especiais de Investigação Sumária (CEIS) em todas as Universidades brasileiras, pois de acordo com o artigo 7° do Ato Institucional do dia 9 do mesmo mês e ano, em seu parágrafo 1°, determina a investigação sumária para a apuração da responsabilidade por atos contra a Segurança Nacional, o regime democrático e a probidade da administração pública.
No Pará, a CEIS foi implementada pela portaria n° 239/64, baixada pelo reitor José da Silveira Neto. Foram nomeados para constituir esta comissão os professores Silvio Augusto de Bastos Meira (presidente), José Achiles Pires dos Santos Lima e Agenor Porto Penna de Carvalho, assessorados pelo Major Antônio José do Carmo Ramos, indicado pelo Quartel General da Oitava Região Militar e Comando Militar da Amazônia .
Para fazer cumprir o determinado no ato institucional, no dia 18 de maio de 1964, a CEIS da Universidade Federal do Pará inicia suas atividades expedindo circulares aos diretores de unidades, aos presidentes dos Diretórios Acadêmicos e a todo corpo docente da UFPA, solicitando remessa dos nomes de todos os suspeitos de práticas e atos delituosos, bem como a oportunidade de todos poderem apresentar denúncias. A Comissão pretendendo notificar a todos, também publica na imprensa um edital que concedia a qualquer interessado o direito de apresentar denúncia . Muitos estudantes foram levados para depor e outros
Foram presos: Pedro Galvão de Lima (direito), Francisco Costa (medicina), Almerinda Freire (serviço social), Raimundo Costa (direito), Ronaldo Barata (direito), Ubirajara Oliveira (engenharia), José Seráfico de Carvalho (direito), João de Jesus Paes Loureiro (direito), Heraldo Maués (filosofia), Walter Pinheiro (filosofia), Roberto Cortez (filosofia), Isidoro Alves (filosofia), Infante Henrique (medicina).
O Livro - UFPA 50 anos: Histórias e Memórias foi coordenado por mim e publicado pela editora da Universidade em 2007. O texto que você acaba de ler é uma pequenao parte do 1º Capítulo intitulado " A Invenção de Universidade Federal do Pará". Leia o primeiro capitulo completo. É uma boa leitura para quem quer conhecer o movimento estudantil, na década de 60 e sua resistência a ditadura militar no Pará. Leia aqui.
Postado por Edilza Joana Oliveira
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