por Patricia Grogg*
“Nunca havia visto ondas tão grandes”, contou Rey Antonio Acosta. Foto: Jorge Luis Baños/IPS
Em Cuba, 577 comunidades estão expostas a inundações de diferentes magnitudes.
Santiago de Cuba, Cuba, 19 de novembro de 2012 (Terramérica).- Ainda é possível ver pratos quebrados, pedaços de brinquedos, livros e uma ou outra foto em meio aos escombros do que foi a casa de Rey Antonio Acosta e de outras famílias em Mar Verde, a praia por onde o furacão Sandy entrou nesta cidade do leste cubano. “Venha por aqui para que sinta o cheiro”, disse ao Terramérica este menino de 12 anos, que guardará para sempre na memória a madrugada de 25 de outubro, quando ventos de até 200 quilômetros por hora e ondas com nove metros de altura arrasaram dezenas de casas na linha costeira.
Entretanto, não parece ter perdido a eloquência ao narrar o ocorrido. Conta como viu o olho do furacão, “negro e com estrelas no centro”, em cuja passagem houve muita calma. “Mas, depois as ondas cresceram e o vento ficou mais forte. Sentimos como o rugido de uma besta sobre nós. As pessoas choravam e eu pensei que era meu dia de morrer”, detalhou. Sua juventude não o impede de tirar a primeira lição do Sandy. “Agora já sei o que é um furacão; quando vier outro, não vamos demorar para fugir”, afirmou. A grande maioria dos moradores de Santiago de Cuba admite que o devastador “ataque” do Sandy os surpreendeu, apesar dos alertas meteorológicos.
“Pensamos que haveria um pouco de vento e um pouco de chuva”, disse María Caridad, moradora do centro da cidade, onde vivem meio milhão de habitantes. Como muitas nesta parte da cidade, sua casa de quase um século não estava preparada para o fenômeno. “Entre meus vizinhos, ninguém levou o Sandy a sério, e isto porque tivemos luz elétrica até tarde”, contou esta mulher de 50 anos. Sobre sua casa caiu um muro que quebrou o teto e deixou a família à mercê do vento. “Aproveitamos um momento de trégua para passar para a varanda do apartamento do lado e buscar proteção”, acrescentou.
Outras pessoas se queixam de que em seus bairros não houve eletricidade desde cedo e não ouviram o último boletim meteorológico, alertando que o furacão passaria pela cidade, capital da província de mesmo nome, um centro urbano de grande densidade e com maioria de casas precárias e vulneráveis a desastres. “Os ciclones passavam perto de Santiago de Cuba e vinham pelo leste. O Sandy entrou pelo norte, e pela primeira vez o olho de um furacão passou pelo nosso território. Se fosse durante o dia, teria causado mais mortes do que as 11 que tivemos, porque as pessoas estariam nas ruas”, disse ao Terramérica Eddy Acosta, da Defesa Civil de Mar Verde.
Passadas mais de três semanas, as ruas locais estão livres dos escombros, mas as árvores sem folhagens, com seus galhos quebrados apontando para o alto, lhes dão um aspecto invernal. Muitas foram arrancadas pela raiz e lançadas contra prédios e casas. Até 12 deste mês, não havia um balanço oficial das perdas econômicas causadas pelo furacão, embora o escritório da Organização das Nações Unidas (ONU) em Cuba estimasse em 137 mil as moradias danificadas em Santiago, 65 mil em Holguín e 8.750 em Guantânamo, as outras duas províncias orientais mais afetadas.
Os prejuízos foram graves para a indústria, as telecomunicações, o setor elétrico e a produção de alimentos, entre outros, e a recuperação é vista como muito difícil para um país que tenta manter à tona sua debilitada economia, após, em 2008, enfrentar três furacões que custaram US$ 10 bilhões em danos. A força das ondas e dos ventos do furacão Sandy devastou não apenas Mar Verde, mas também outras comunidades costeiras, como Cayo Granma e Siboney, e várias instalações turísticas situadas a pouca distância do mar. Segundo as autoridades, esta situação acrescentou elementos para propostas mais “realistas” em matéria de construção e reordenamento territorial.
Pesquisadores do impacto da mudança climática em Cuba calculam que 577 comunidades do país estarão expostas a inundações de diferentes magnitudes, devido à elevação do nível médio do mar e às fortes ondas que se originam pela ação direta ou indireta de furacões de grande intensidade. Neste aspecto, recomenda-se trabalhar na proteção dos ecossistemas, como mangues e cristas de arrecifes coralinos, que são barreiras naturais para o avanço do mar, bem como evitar novas construções em áreas do litoral muito ameaçadas.
O Sandy danificou locais muito povoados e não acostumados a um furacão com enorme capacidade devastadora, informou ao Terramérica o especialista Ramón Pérez, do Instituto de Meteorologia. A melhor adaptação começa por adotar previsões, disse. “Se pensamos que pode haver furacões mais intensos no futuro, a primeira coisa que devemos fazer é nos prepararmos para enfrentar os atuais, o que inclui, naturalmente, a redução de vulnerabilidades e maior educação das pessoas”, ressaltou algo falar sobre as lições deixadas pelo ciclone para todo o mundo.
O furacão Sandy foi o décimo-oitavo ciclone tropical da temporada 2012 e o décimo a atingir o grau de furacão. Seus ventos e suas chuvas afetaram Haiti, República Dominicana, Jamaica, Cuba, Bahamas, Bermudas, Estados Unidos e Canadá, deixando em sua passagem perdas econômicas e quase 200 mortos. Envolverde/Terramérica
* A autora é correspondente da IPS.
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