Mapa de Mosqueiro-Belém-Pará

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quarta-feira, 8 de agosto de 2012

“O povo cubano não quer o retorno ao capitalismo sob hipótese alguma”

Em entrevista ao Página 13, Cloves Castro relata sua visita à Cuba por ocasião das celebrações do 1º de Maio e afirma que os cubanos estão dispostos a superar os problemas que enfrentam e avançar com o socialismo e a revolução.
 
Página 13: Esta foi a primeira vez que você esteve em Cuba?
Cloves Castro: Sim, foi a primeira vez, embora em meu habeas data[1] conste que eu já havia ido à Cuba. Não sei de onde eles tiraram isso. Com certeza, se não tivesse sido preso em dezembro de 1969 eu teria ido, mas em condições diferentes das atuais. O objetivo seria me preparar melhor militarmente para o combate à ditadura militar.

P13: Como surgiu a oportunidade de visitar Cuba?
CC: Eu fiz parte de uma delegação brasileira para acompanhar o 1º de Maio.  Ela foi composta por companheiros da CUT, do PT, do PSB, do PCdoB, do PCB. Havia pessoas de vários estados: Espírito Santo, Pernambuco, São Paulo, Distrito Federal, Bahia. Uma parte da delegação foi três dias antes da outra, que chegou no dia 29 de abril. Nos encontramos todos em Havana e seguimos um cronograma de viagem que havia sido estabelecido. Visitamos diversos lugares: a Fortaleza San Carlos de La Cabaña, o Museu da Revolução, uma fábrica de charutos, uma fábrica de cervejas etc. Lá dentro da fábrica, a central sindical e as comissões de trabalhadores convocavam os trabalhadores para o 1º de Maio.

P13: E como foram as celebrações?
CC: Foi uma coisa maravilhosa. Enquanto a gente vê no Brasil que as mobilizações do 1º de Maio acontecem com shows e sorteios de carros, em Cuba não é assim. Foi realmente espetacular, mais de 500 mil pessoas nas ruas. Nós recebemos uma comunicação de que deveríamos sair do hotel às 5h da manhã. Então, acordamos bem cedo e vimos que centenas de trabalhadores já seguiam para a Praça da Revolução, era impressionante. O desfile começou exatamente às 7h da manhã. Foram anunciados os ministros e autoridades presentes, as delegações estrangeiras, as centrais sindicais. Em um dado momento, um dirigente da central sindical cubana anuncia “Compañeros, acaba de llegar el compañero general presidente Raúl Castro!” e a massa fez uma grande ovação. O desfile era composto por delegações de várias categorias profissionais, policiais e as Forças Armadas (sem armas!), os estudantes, crianças nos ombros dos pais, todos passando com muita alegria. Foi emocionante. O locutor anunciava as delegações, não teve aquele monte de discursos, era realmente a festa dos trabalhadores. O eixo central foi a libertação dos cinco companheiros cubanos presos nos Estados Unidos. Este era o tema principal das faixas e cartazes, que também tinham palavras de ordem contrárias aos yankees, ao imperialismo e ao bloqueio. Não vi nenhuma faixa com reivindicações sindicais de trabalhadores. O desfile durou até meio-dia, mais ou menos.

P13: Quais são as formas de mobilização e organização do povo cubano?
CC: O movimento sindical, as associações, as entidades estudantis, os Centros de Defesa da Revolução (CDRs) – uma frente de massas de congrega trabalhadores, moradores dos bairros, estudantes, intelectuais e se organizam nas comunidades. Cada bairro tem três ou quatro CDRs, que têm como função reivindicar as demandas levantadas por seus membros em cada região, além de contribuir para a segurança e a defesa de Cuba. Os salários em Cuba não são altos, os maiores estão em torno de 30 CUCs[2]. Mas o custo de vida é muito baixo, eles não pagam escola, os livros e materiais didáticos são gratuitos, o sistema de saúde é público e gratuito, os remédios, o aluguel e as contas de água, luz etc. são extremamente baratas. Porém, os salários ainda são muito baixos. Existe uma grande expectativa de mudanças, no sentido de reorientar a economia como parte de um processo para a melhoria da situação dos trabalhadores, e o povo se organiza para isso.

P13: Na grande impressa brasileira é comum a opinião de que não existe democracia em Cuba. Como você avalia esta questão?
CC: A democracia existe. Os parlamentares são escolhidos e eleitos a partir dos seus locais de trabalho, de moradia, a partir dos CDRs. Mas a democracia cubana é participativa e representativa, mistura democracia direta e indireta. Recentemente, houve um grande processo de discussão para definir as mudanças em Cuba, em que participaram ativamente cerca de 7 milhões de pessoas. Neste processo foram apresentadas as demandas, as críticas, as angústias, as esperanças do povo. As principais críticas eram direcionadas à burocracia e havia demandas pela diminuição do número de ministérios e pela descentralização do Estado, conferindo mais poder aos municípios e comunidades, que passariam a ter mais autonomia e responsabilidades. Mas em nenhum momento desta discussão, nem na nossa visita, foram apresentadas posições contra o socialismo. O povo cubano não quer o retorno ao capitalismo sob hipótese alguma. Hoje, Cuba está em busca do aperfeiçoamento do socialismo. Em seu discurso de posse, Raúl Castro disse que não havia sido eleito para destruir o socialismo, mas para aperfeiçoá-lo. Nas conversas que tivemos nas ruas, nos CDRs, na União de Jovens Comunistas (UJC), ouvimos críticas aos erros cometidos na construção do socialismo, mas não ao socialismo.

P13: E como está a juventude cubana?
CC: Esta é uma das questões que me deixaram bastante satisfeito. Fomos recebidos pela UJC em uma atividade e os companheiros nos falaram da situação dos jovens cubanos, da participação da juventude na construção do socialismo e do futuro de Cuba. O país realmente prepara a juventude para assumir a continuidade da revolução. Na ocasião eu fiz uma intervenção, dizendo que queria saudá-los e que saía de Cuba muito satisfeito por saber que eles se preocupam com a formação da juventude cubana.

P13: Quais são as perspectivas que você vê para o socialismo na ilha?
CC: Eu vejo muita perspectiva, dada a participação e a consciência que o povo tem. Eles reconhecem que existem muitos problemas, mas sabem que o que causou muitas das dificuldades foi o bloqueio econômico, que já vai completar 54 anos. Eles tem plena consciência dessas problemas, mas estão prontos e dispostos a superá-los e avançar com o socialismo e a revolução.

P13: Por fim, o que mais te chamou a atenção quando esteve em Cuba?
CC: Embora existam bairros e comunidades pobres, como a parte velha de Havana, onde está concentrado o povão, não há nenhum morador de rua, ninguém mora na rua! Não vi nenhuma criança dormindo na rua ou pedindo esmola. Isso me impressionou bastante, além do 1º de Maio, que eu jamais vou esquecer.



[2] Pesos conversíveis, cotados em cerca de 1,20 pesos por dólar em abril/maio.

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